sábado, 22 de julho de 2017

Julho em A Voz Ipuanense.

Garantia do Direito à Educação ou cumprimento do dever?
Por Orandes Rocha*.

Fui convidado para ser o Palestrante que abriria o I Encontro Regional de Direito à Educação, promovido pelo Centro de Ensino Superior de São Gotardo/MG (CESG), para falar sobre o Plano Nacional da Educação (PNE) com a seguinte provocação: Garantia do Direito à Educação ou cumprimento do dever?
A plateia, composta por alunos e alunas do Direito e da Pedagogia, exigia de mim uma resposta não simplória para uma questão tão complexa.
Por um lado, exaltamos aos quatro ventos que Educação nos é um direito, inclusive constitucional, mas nos esquecemos muitas vezes que para todo direito à uma correspondência: o dever.
O que é direito para alguém é dever para outro alguém. O outro alguém, no caso, é o Poder Público, seja ele Municipal, Estadual ou Federal, cada um dentro das suas competências legais.
O binômio direito/dever é, portanto, indissociável.
Na ocasião, ousei divagar sobre a subjetividade do direito à Educação.
O art 5º da LDB traz que a Educação é um direito público subjetivo para especificar que, cabe ao cidadão exigir das autoridades competentes a contemplação deste direito, portanto é facultando ao indivíduo a contemplação deste direito.
Subjetividade essa que deve ser vista com cautela, uma vez que pena nossa legislação o ensino era obrigatório dos 7 aos 14 anos e agora dos 4 aos 17 anos. Neste caso, não cabe ao indivíduo a decisão de acionar o direito ou não.
Cito a questão da obrigatoriedade para introduzir o outro lado da moeda: o dever.
Tudo o que é direito para alguém encontra o correspondente dever em outrem.
Evidente que ao tornar obrigatória a escolaridade e direito do cidadão à Educação Básica o Estado tem o dever de garantir que este direito seja efetivado.
Razão pela qual a oferta de vagas é imprescindível, não podendo ser negada sob nenhuma circunstância. O aluno tem o direito à matrícula na escola pública que ele bem entender.
Curioso como ao excluir a Educação Infantil e o Ensino Superior do binômio direito/dever o Estado praticamente “passa recibo” de que é incapaz de garantir estas modalidades de ensinos a todos cidadãos e cidadãs.
Tornar a Educação Infantil obrigatória, obrigaria o Estado a oferecer, por exemplo, vagas em creches a todas as crianças. O mesmo com o Ensino Superior.
Aliás, este último um gargalo impossível de ser desfeito, haja visto que Universidade Pública no Brasil é para poucos, quando deveria ser para todos, como discutirei adiante.
Mas creche é um gargalo passível de ser desfeito, basta investimento maciço nesta etapa da educação que até 20 anos atrás era tratada (e financiada) como responsabilidade da Assistência Social e não da Educação.
Não por outra razão em mais de 60 anos de História Ipuanense apenas 4 Creches foram construídas pelo Poder Público, sendo uma delas ampliada mais tarde. Coincidentemente, esta a que me refiro, foi construída e ampliada durante nossa gestão a frente do Departamento de Educação do Município.
O PNE traz em sua Meta 1 a questão da Educação Infantil com os objetivos de universalizar a educação infantil e atender à metade da demanda por vagas em Creche.
O reconhecimento, como disse antes, de ser impossível oferecer creche a todos mas uma sinalização de que o objetivo desta meta é minorar o problema pela metade. Para isso, há inúmeras estratégias inclusive com financiamento público para construção de creches.
Divagações como estas me levam a refletir sobre outro binômio presente na educação: quantidade/qualidade.
Ao oferecer vagar a todos, ao eliminar o analfabetismo funcional, ao dobrar vagas etc o PNE estipula trabalha com quantidade, mas e a qualidade?
A qualidade expressa na Meta 7 refere-se à Educação Básica, aferida pelo índice oficial, o IDEB.
Mas o IDEB de fato avalia a qualidade do ensino?
Essa questão daria resposta para outro artigo, e não vem ao caso no momento.
O que discuto é a questão da qualidade nem sempre acompanhada da quantidade.
Universidade Pública por exemplo. A Universidade de São Paulo (USP) se jacta - e com todos os méritos e justiça - de ser a melhor Universidade Brasileira ranqueada no QS World University Ranking, única Brasileira entre os 200 primeiros lugares, classificada em 120º na edição de 2016 do referido ranking.
Mas eu pergunto: Para quem é a USP?
Para uma minoria privilegiada que, por seus próprios méritos, destaco, conseguiram uma vaga na melhor Universidade do Brasil e uma das melhores do Mundo.
O que me leva a outra pergunta: Por que não “USP” para todos?
Soa meio utópico, mas utópico eu sou, desejar que a Universidade Pública deva ser, como a Educação Básica, para todos, e que a Universidade Pública seja de qualidade, como a USP e tantas outras no Brasil.
Como bem dizia – e diz – Mário Sérgio Cortella, "Qualidade sem quantidade não é qualidade, é privilégio... Qualidade social exige quantidade total“.
A Universidade Pública, sob esse prisma, é, infelizmente, um privilégio.
Mas tanto a quantidade como a qualidade necessitam de investimento financeiro. Em outras palavras: dinheiro.
O PNE traz consigo em sua meta 20 a fonte de recursos de onde sairia todo o dinheiro necessário (a revista Exame calculou em R$ 800 bilhões nos 10 anos de execução do Plano) que prevê maciço investimento na Educação e a meta audaciosa de elevar a porcentagem do PIB nacional aplicado em Educação dos atuais 5% para 10% em 2024.
Preocupa que valor tão alto de investimento tenha sido depositado no produto que, quando da elaboração, votação e aprovação do PNE, era a menina dos olhos do Governo Federal: O Pré Sal.
Segundo o PNE, 75% dos Royalties do Pré Sal seria destinado à Educação, além de 50% de um Fundo Social a ser criado.
Depositar o investimento da educação nacional em um produto que ainda sequer tinha jorrado nas torneiras da empresa prospectora é o mesmo que garantir a compra de um carro com o prêmio da loteria que espero ganhar semana que vem.
Quando da definição de boa parte do financiamento do PNE por meio do Pré Sal, o preço do barril de petróleo era aproximadamente US$110,00; enquanto em abril último este preço estava em pouco mais de US$50,00.
Em outras palavras: nosso “bilhete de loteria” desvalorizou pela metade em poucos anos, inviabilizando a “compra do carro”.
Como tentei explicar na palestra adaptada a este texto, o Direito à Educação encontra-se na mesma medida que o Dever do Estado, e este deve ser balizado pelo binômio quantidade/qualidade se quisermos de fato ter a Educação que sonhamos.
O PNE foi uma ótima iniciativa neste sentido, mas convenhamos, com o planejamento financeiro (indispensável, pois não se faz Educação em dinheiro) que foi realizado, corre o mesmo risco de ser um Plano que apontará evoluções, mas não o cumprimento efetivo de suas metas.

*Orandes Rocha, com todo respeito aos que vivem disso, acha palestra um dinheiro preguiçoso.

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