“Progressão continuada”.
Por Orandes Rocha.
Voltemos ao meu “Samba de uma nota só” e
falaremos de educação novamente nesta edição.
Mais precisamente no polêmico assunto
aprovação/reprovação de alunos.
Assistimos nesta campanha eleitoral ao
Governo do Estado, candidatos criticando o atual Governador e seu partido de
acabar ter destruído a educação no Estado de São Paulo com o advento da
“aprovação automática”.
E todos os candidatos oposicionistas diziam
que, se eleitos, acabariam com esta prática no ensino público estadual
paulista.
Pois bem.
Acreditar que a má qualidade do ensino no
Estado de SP (como afirmam os candidatos) ocorra apenas em função da progressão
continuada (que diga-se de passagem, é diferente de aprovação automática) é um
grande exagero.
Desconsidera variáveis que, em meu ponto de
vista, são muito mais importantes, tais como: capacitação em serviço de
professores e gestores, reforma curricular, infraestrutura e salário.
Mas como rende mais votos dizer que criança
passa de ano sem aprender e isso vai acabar caso a ou b seja eleito; foi este o
discurso ouvido na campanha.
Eis que as urnas não se importaram muito se
crianças estão passando sem saber conteúdo e reelegeram a “progressão
automática” para mais 4 anos.
Penso que a questão da aprovação/reprovação
de alunos deva ser discutido com maior racionalidade, ponderando sobre algumas
questões que cito abaixo.
É justo reprovar um aluno que foi aprovado em
todas as disciplinas porém, por exemplo, em matemática, ele não conseguiu
atingir o mínimo exigido?
Em outras palavras: fazer o aluno estudar
tudo de novo no ano seguinte (inclusive o que ele já demonstrou dominar no ano
anterior) só por causa de uma disciplina?
É justo um aluno ser reprovado por meio ponto
em matemática (de novo ela) e outras duas ou 3 disciplinas?
Este aluno esteve bem próximo de atingir o
mínimo exigido (por sinal um conceito arbitrário, pois não leva em conta por
exemplo a evolução do aluno), e por meio ponto deverá “aprender” tudo outra
vez.
E talvez a pergunta mais reflexiva: a culpa
pela reprovação do aluno é 100% do aluno?
Como exigir de um aluno que ele saiba a
matéria se a escola não oferecer os meios necessários para tal? Como
recuperação, atividade diferenciada, acompanhamento.
Agindo assim estamos utilizando a avaliação
da pior maneira possível, um mero instrumento de classificação, punição e
premiação de alunos, quando na verdade a avaliação deveria ser utilizada como
balizamento das ações educacionais para corrigir caminhos, adotar novas medidas
ou continuar o que vem dando certo.
Assim sendo, a avaliação serve tão somente
para rotular alunos, dividindo-os entre “bons e ruins”, sendo os primeiros
aqueles que colherão todos os louros da vitória, e os segundos, fracassados que
deverão novamente estudar tudo o que lhes fora ensinado no ano anterior.
Como estudioso de avaliação educacional não
consigo conceber esta função à avaliação e vejo nesta prática recorrente, a
responsável pelo temor e resistência
generalizado pela realização de uma avaliação, tanto por alunos como
professores (no caso de avaliação deocente).
Dia de prova tem de ser encarado como um dia
normal, um dia em que o professor deve aferir o que o aluno sabe e não o que
ele não sabe. E para o aluno, um dia de mostrar o que aprendeu e não o dia em
que pode fazê-lo repetir todo um ano letivo.
Mas para deixar claro: Não sou favorável ao
aluno passar de ano sem aprender, mas sou contra o uso da reprovação como
prática pedagógica.
Como sou contra também o uso de metas e
índices dentro da educação.
Não raro, vemos gestores em educação
estabelecendo metas de reprovação.
Estipulam, no conforto de suas salas
climatizadas, que (exemplo aleatório) apenas 3% dos alunos devem ser reprovados
neste ou naquele ano.
Tudo para poder mostrar índice de que na
cidade a reprovação diminuiu em x%, sem explicar à população no entanto que a
queda neste índice se deu em razão de um ordenamento arbitrário e não em função
de ações didático-pedagógicas de auxílio a alunos e professores em favor de uma
melhoria no processo ensino aprendizagem.
Números frios neste caso mascaram a realidade
por meio de uma prática perniciosa.
E quando ouço estas metas de reprovação fico
imaginando como ela deva ser feita.
Faz-se uma listagem geral dos alunos, um
ranqueamento (outra função errônea que atribuem à avaliação) entre todos os
alunos da escola e os últimos 3% serão reprovados?
É assim?
Porque se for, a educação na cidade vira um
“Campeonato Brasileiro” de pontos corridos, onde os últimos classificados são
rebaixados e aos demais, não importa se serão campeões, basta apenas estar
acima dos últimos 3% para poder sobreviver na série A do campeonato.
Significa dizer que se um aluno vai mal o ano
todo, basta apenas ser melhor que determinado número de alunos para que ele
possa ser aprovado.
Correr-se o risco de nivelar por baixo a
qualidade do ensino e aprovar aluno que tirou 2,0 o ano todo, simplesmente
porque dos 100 alunos de sua escola, 3 tiraram nota 1,0.
É justo?
Mas o que fazer então? Reprovar todos alunos
que não atingiram a meta ou aprovar todo mundo?
Eu sempre confio no bom senso do docente para
decidir qual aluno deve continuar na série seguinte e qual aluno ele entende
que, um ano mais irá amadurecê-lo a ponto de seguir sua caminhada até o final.
É o professor em sala de aula quem sabe qual o
aluno que não deve ser reprovado porque faltou apenas meio ponto; é o professor
em sala de aula quem sabe diferenciar aluno com dificuldade de aluno com irresponsabilidade;
é o professor em sala de aula quem deve ter a autonomia para decidir sobre esta
questão.
Eu estou apenas palpitando sobre o que penso.
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